Um dia destes, durante alguns minutos, sentei-me calma e pachorrentamente nos bancos a sul do desgraçado jardim da Figueira, sem nada de importante ou urgente para fazer, a não ser relembrar um ícone figueirense da minha juventude, que permanece, para quem tem memória, como referência de uma dada época e de uma certa forma de viver: a PRAIA DA SARDINHA, que a fotografia mostra.
Como tinha tempo, disponibilidade e gosto de olhar (simplesmente olhar, apenas olhar...) fui, ao mesmo tempo, notando que iam passando pessoas.
Presumo que devem ter empregos importantes, pois caminhavam cheias de pressa, enquanto iam falando, sem parar, ao telemóvel.
É aqui que está o segredo da minha qualidade de vida.
Estou só aqui sentado a vê-los passar e a pensar na sorte que tenho de não ter um emprego importante.
Melhor ainda: de nem sequer ter emprego...
António Agostinho, o autor deste blogue, em Abril de 1974 tinha 20 anos. Em Portugal havia guerra nas colónias, fome, bairros de lata, analfabetismo, pessoas descalças nas ruas, censura prévia na imprensa, nos livros, no teatro, no cinema, na música, presos políticos, tribunais plenários, direito de voto limitado. Havia medo. O ambiente na Cova e a Gala era bisonho, cinzento, deprimido e triste. Quase todas as mulheres vestiam de preto. O preto era a cor das suas vidas. Ilustração: Pedro Cruz
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
1 comentário:
A praia da sardinha desapareceu até o jardim coitado é tudo menos um jardim.
Enviar um comentário